sábado, junho 06, 2009

Terror na Madrugada.

Nunca me ajustei muito bem à vida social. Não gosto da maioria das pessoas e sempre preferi agir sozinho, fazendo as coisas do meu jeito, me esquivando de qualquer trabalho em equipe. Talvez por isso a Medicina Veterinária sempre figurasse em minha vida como sendo a primeira opção profissional. Lidar com animais sempre me pareceu mais simples. Nada de julgamentos, muito pouca reação. Logo depois de formado fui substituir uma amiga em alguns plantões. Rapidamente descobri que os anos de faculdade não haviam me preparado para tamanha aflição. Numa madruga fui acordado de supetão pelo enfermeiro para uma consulta. Instantaneamente fui tomado por uma onda de insegurança e desengano que se intensificou quando avistei no final do corredor o suposto paciente balançando seu rabinho e esbanjando total saúde e disposição. Que diabos aquele animal poderia ter de errado para fazer com que seus donos achassem que era necessário levá-lo ao veterinário em plena madrugada de domingo? Seria eu quem teria de descobrir. Não me lembro de outra ocasião em que desejei tanto que um corredor fosse mais longo. Cada segundo de análise era essencial. E como quis que fossem mais. Coloquei o bendito animal sobre a mesa e a única informação que os zelosos proprietários souberam me passar era que ele estava respirando mal e que outro animal tinha tido o mesmo sintoma e morrera em seguida. Excitante informação. Em meio a dúvidas e incertezas resolvi começar pelo começo. Tratei de pegar meu estetoscópio para ver (ouvir) se aquele coraçãozinho saltitante tinha algo a me revelar. Neste momento notei que o casal de proprietários acompanhava meus movimentos com os olhos como se já previssem um resultado específico. O que vale lembrar, só aumentou meu sofrimento. Reuni todas as minhas energias e as direcionei para os ouvidos numa tentativa desesperada de decodificar qualquer alteração. Qual não foi minha surpresa e contentamento em descobrir logo de primeira que se tratava de um sopro cardíaco, o qual causava um acúmulo de líquido no abdome do animal, que comprimia os pulmões e assim, dificultava a respiração. Agora, senhor do conhecimento, seguro e recomposto, podia encarar o casal e lhes passar meu veredicto. Mas foi somente após eu terminar minha genial explanação que eles se identificaram. Tratava-se de um casal de médicos que tinham um filho também médico e que numa espécie de Conferência Médica Familiar tinham examinado o animal e chegado à mesma conclusão. Até hoje não entendi o que eles procuravam naquele hospital veterinário às 03h30min da madrugada de um domingo. Um casal de médicos capazes de formar um filho na mesma profissão realmente precisava do parecer de um veterinário recém formado, desesperado e inseguro? Imagino que só queriam me torturar. São essas coisas que me fazem não gostar das pessoas.

Foto: Anibal Bastos

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